Ficha técnica:
Realização e argumento: Laura Gonçalves
Produtor: Laura Gonçalves
Montagem: Laura Gonçalves
Som: Laura Gonçalves
Animação: Laura Gonçalves
Técnica de Animação: Desenho sobre papel, auxiliado por computador
Legendas: Inglês
Portugal, 2013, ANI·DOC, HD, Cor, 6’13”
A curta-metragem “Três Semanas em Dezembro” tem um enredo simples que se resume a meia dúzia de palavras: a partir da experiência da própria autora, Laura Gonçalves, retrata-se um Natal em família, evidenciando costumes que se renovam todos os anos por essa altura. A fórmula para o sucesso deste filme parece, na verdade, bastante simples: por um lado, a época natalícia cria facilmente a empatia com o espectador pelo confronto com experiências semelhantes; por outro, o “espírito de família” sobrevoa qualquer imaginário associado à quadra de Natal. É inegável que são ingredientes autênticos para enaltecer a família, que encontra aqui a sua expressão máxima na ceia de Natal e que, logo depois, é sublimada naquela oração quando aquela Mulher (não um trapo), vinda de um qualquer lar de idosos para passar o Natal com os seus, dirige as suas preces igualmente para a família, porque esta tem lugar reservado no seu coração.
Ainda assim entendo que há algo mais nesta curta que dá um sentido superior. Então vejamos. Laura Gonçalves optou por uma narrativa, em formato diarístico, que é caracterizada pela fluidez das cenas, revelando preferência por planos de pormenor e grandes planos de pedaços de vida – umas mãos, um rosto, um gesto… Aliás, a primeira perspetiva, apressada, é dada por uma mosca que, sempre a zunir, procura incessantemente sabe-se lá o quê. No final, outra mosca parece encontrar o que pretendia nos restos de um prato, em final de festa.
Ora, se no Dicionário de Símbolos, de Jean Chevalier, se diz que a mosca pode simbolizar a busca permanente, julgo que ela representará uma busca efémera. Simbolizará a própria condição do ser humano?
De facto, as diferentes gerações daquela família lembram-nos que a vida é breve e passa ligeira. Acho mesmo que o traço impreciso do desenho (ou da técnica utilizada) reforça essa ideia. E atinge toda a humanidade: as vozes que se ouvem e não precisam de ter um rosto ou a indefinição das personagens sugerem a intemporalidade e universalidade das representações.
No entanto, em todos os momentos, na rusticidade daquela terra – Belmonte – a vida acontece, como tem de acontecer, em dias de Natal, talvez por isso não se deva esperar a compaixão ou um sentimentalismo piegas do espectador. Pois, para além da celebração da família, esta curta-metragem é, na minha opinião, uma verdadeira celebração da vida, tantas vezes feita de momentos simples e banais (inúteis até), mas que queremos vivê-los, ou recordá-los, seja lá em que idade for.
Também eu recordo deste último Natal um momento singular e delicioso, a fazer-me lembrar aquela partida de dominó a que assistimos na curta: após a Ceia de Natal, eu e a minha parceira, a minha avó paterna, desafiámos o meu pai e a minha tia Anabela para uns joguinhos de cartas. Não foi pelo resultado, um empate (com sabor a vitória), mas foi poder fruir, num ambiente de alegria e descontração, da companhia da minha avó, com quem passo muito pouco tempo. Na tarde do primeiro dia de Ano Novo tive a oportunidade de repetir o momento – e saímos vitoriosas. Um bom sinal.
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Belíssima reflexão.Obrigada Margarida!