A “Julieta” de Débora Gonçalves

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Ficha técnica:

Título original: Julieta
De:Pedro Almodóvar
Com: Adriana Ugarte, Rossy de Palma, Emma Suárez
Género: Drama, Romance
ESP, 2016, Cores, 99′

“Desde há não assim tanto tempo tem-me perseguido o impulso de me aproximar da grande tela para contemplar o que através dela me invade o espírito e por conseguinte me promove um eloquente estado de nirvana. Trata-se de uma sensação inexprimível, absolutamente vivível apenas pelos que comigo partilham esta quase devoção pela arte mais pujante e para mim a mais querida. O Cinema tem-me levado pela mão até às minhas próprias entranhas, tem me feito descobrir e redescobrir a minha essência, é através do cinema que me renovo, que me purgo. Daí a minha constante tentativa de proximidade. Sou-lhe tudo menos indiferente, deixo-me embalar e o despertar é sempre um jarro de emotividade.
Aconteceu-me assim “Julieta”, de Pedro Almodóvar. Acima de tudo uma obra de arte, uma peça notável neste já meritoso percurso do realizador pelo cinema espanhol e mundial. Não me permiti não discorrer sobre o filme, e a partir daí uma vaga de cogitações invadiu-me levando-me ao cerne do próprio filme, à dor e ao luto. Automaticamente a questão visual sobressaltou-me, vi-me perante um filme carregado de dramatismo no entanto todas as cores eram quentes, os vermelhos, os amarelos, e os laranjas. Logo o primeiro enquadramento do filme fez-me supor que se seguiria uma história carregada de erotismo e paixão, contudo não precisei de muitos mais dados para perceber que a minha suposição estava equivocada. Bastaram-me poucos minutos com Julieta, brilhantemente interpretada por Emma Suarez (no momento presente da história), para perceber que todo o seu rosto cerrado escondia na verdade uma dor tão profunda comparável à de uma ferida aberta a jorrar de sangue. Essa mágoa debutante desde há décadas foi-nos apresentada com uma analepse. Julieta outrora uma jovem, por sua vez interpretada por Adriana Ugarte, que tal como Emma deslumbrou numa atuação absolutamente petrificante e miseravelmente bela. A evolução da personagem foi-se cruzando com a solidão sequente a que ia sendo vetada e por um sentimento de culpa que em espiral embatia diretamente na vontade jamais concretizada de sair da cidade onde vira pela última vez a filha que lhe havia renunciado os laços. Uma filha que Julieta não tivera tempo de conhecer.
Toda a culpa, e todo o luto refletidos numa fotografia tão real, e tão moderna criaram-me a sensação de estar a ser consumida pelo sofrimento de Julieta à qual não pude ficar insensível, e a qual cujo nome me lembrou a obra de Shakespeare e o seu triste destino. Destino o qual não podemos assegurar uma vez que numa rajada de mestria ficamos sem saber o que de facto acontece à mulher que por fim recebeu uma carta da filha que se perdera e que finalmente se lembrara que algures havia deixado uma mãe a lamentar-lhe a fuga.
Fica portanto, e por aqui todo o meu deleite sem jamais me permitir esquecer o silêncio que me invadiu o peito assim que o filme terminou. Pedro Almodôvar nunca me desilude, e jamais me ilude.”

Débora Gonçalves

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2016-nov

Muito obrigada, Débora, por mais esta preciosa contribuição. É sempre  um prazer reencontrá-la no “nosso habitat”, ou seja, no Cineclube de Amarante.

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